quinta-feira, março 23, 2006

Tribo


Há uma tribo que sonha
e nunca esqueceu as asas.
E acredita em coisas simples,
sol, pão, chuva, beijo, lua.
E mesmo quando o sangue
tinge as tardes e os rios,
e as palavras se transformam
em veneno, pedras e facas,
alimenta as sementes da esperança
com lágrimas e pequenos gestos limpos
para que virem árvore.

(Roseana Murray)

Tempo Rei


Não me iludo
Tudo permanecerá do jeito que tem sido
Transcorrendo
Transformando
Tempo e espaço navegando todos os sentidos
Pães de Açúcar
Corcovados
Fustigados pela chuva e pelo eterno vento
Água mole
Pedra dura
Tanto bate que não restará nem pensamento

Tempo rei, ó, tempo rei, ó, tempo rei
Transformai as velhas formas do viver
Ensinai-me, ó, pai, o que eu ainda não sei
Mãe Senhora do Perpétuo, socorrei

Pensamento
Mesmo o fundamento singular do ser humano
De um momento
Para o outro
Poderá não mais fundar nem gregos nem baianos
Mães zelosas
Pais corujas
Vejam como as águas de repente ficam sujas
Não se iludam
Não me iludo
Tudo agora mesmo pode estar por um segundo

Tempo rei, ó, tempo rei, ó, tempo rei
Transformai as velhas formas do viver
Ensinai-me, ó, pai, o que eu ainda não sei

Mãe Senhora do Perpétuo, socorrei

(Gilberto Gil)

Cidadezinha cheia de graça...


Cidadezinha cheia de graça...
Tão pequenina que até causa dó!
Com seus burricos a pastar na praça...
Sua igrejinha de uma torre só...

Nuvens que venham, nuvens e asas,
Não param nunca nem um só segundo...
E fica a torre, sobre as velhas casas,
Fica cismando como é vasto o mundo!...

Eu que de longe venho perdido,
Sem pouso fixo (a triste sina!)
Ah, quem me dera ter lá nascido!

Lá toda a vida poder morar!
Cidadezinha... Tão pequenina

Que toda cabe num só olhar...

(Mario Quintana)

quarta-feira, março 22, 2006

Responsabilidade universal


A humanidade é uma só e este pequeno planeta é nossa única casa.
Se temos de proteger esta casa, cada um de nós precisa experienciar um sentimento vivo de altruísmo universal.

Nosso planeta foi abençoado com vastos tesouros naturais.
Se os usarmos adequadamente, todo ser humano poderá usufruir de uma vida rica e de bem-estar.

Hoje, enfrentamos muitos problemas.
Alguns criados por nós em conseqüência de diferenças ideológicas, religiosas, raciais, econômicas.
Entretanto, chegou o momento de pensarmos em um nível mais profundo, em nível humano, e a partir daí apreciar e respeitar essa mesma condição nos outros seres humanos.

Devemos construir relacionamentos mais próximos, de confiança mútua, compreensão e ajuda.

Todos queremos a felicidade e evitar o sofrimento.
Todos temos o mesmo direito de ser felizes, e aí reside a nossa igualdade fundamental.

Não é necessário seguir filosofias complicadas.
Nosso próprio cérebro, nosso próprio coração é o nosso templo. A filosofia é a bondade.

Quando os seres humanos se desentendem, mostram que esqueceram suas semelhanças fundamentais para supervalorizar razões secundárias.
Por razões secundárias um homem destrói outro homem e destrói o planeta que o abriga.

Cultivar-se internamente é que garantirá nosso direito à felicidade e até à sobrevivência.

Porque, por mais mortíferas que sejam as armas produzidas pelo medo e pelo ódio,
é necessária a mão de um homem para detonar o gatilho.
(Dalai Lama)

Exausto


Eu quero uma licença de dormir,

perdão pra descansar horas a fio,

sem ao menos sonhar

a leve palha de um pequeno sonho.

Quero o que antes da vida

foi o sono profundo das espécies,

a graça de um estado.

Semente.

Muito mais que raízes.

(Adélia Prado)

Reinvenção



A vida só é possível
reinventada.
Anda o sol pelas campinas
e passeia a mão dourada
pelas águas, pelas folhas...
Ah! tudo bolhas
que vêm de fundas piscinas
de ilusionismo... – mais nada.
Mas a vida, a vida, a vida, a vida
só é possível reinventada.
Vem a lua, vem, retira
as algemas dos meus braços.
Projeto-me por espaços
Cheios da tua Figura.
Tudo mentira! Mentira
da lua, na noite escura.
Não te encontro, não te alcanço...
Só – no tempo equilibrada,
Desprendo-me do balanço
Que além do tempo me leva.
Só – na treva, fico: recebida e dada.
Porque a vida, a vida, a vida
a vida só é possível
reinventada.

(Cecília Meireles)

quinta-feira, março 16, 2006

Oração a Gaya


Amada Mãe Natureza,
Amada Consciência da Natureza,
Amada Mãe Água,
Amada Consciência da Flora e da Fauna.
Amada sois.
Terras e Matas, colinas e campos.
Luz e luar.
Bendita és tu Mãe Natureza que a todos provém.
Bendita és tu, que a todos acolhe.
Em suas águas se encontra a cura.
Em suas matas se encontra a cura.
Em todo seu, a cura está.
Amada sois.
A Natureza, como um ventre materno, provém à vida aos que aqui vieram habitar.
A Natureza, como um velho sábio, ensina a vida aos que aqui vieram aprender.
A Natureza, como um novo livro, ensina ao homem a ser sábio.
A Natureza, como fonte divina, ensina aos seus como ser parte do todo.
Amada sois.
As nuvens e os rios, mostram a força das águas e dos ventos.
As nuvens e os rios, mostram quem sempre vai. Como a vida segue.
As nuvens e os rios, falam do amor que corre, como sangue nas veias das matas.
As nuvens e os rios, trazem o amor até os corações, como o oceano e o barco.
Amada sois.
Que o milagre da Mãe Natureza, seja o milagre de vossas vidas.
Que o milagre da Mãe Natureza, seja a cura de vossas vidas.
Que o respeito à Mãe Natureza, seja o respeito por vossas vidas.
Que a renovação da Mãe Natureza, seja a renovação de vossas vidas.
Amada sois.
Que a Consciência Divina das Matas, encontre ressonância em vós.
Que a Consciência Divina das Águas encontre concordância em vós.
Que a Consciência Divina das Terras, encontre abundância em vós.
Que a Consciência Divina dos Ventos, encontre elegância em vós.
Amada sois.
Amada és.
Amados vós.
Amados somos.
Que a alegria e o amor vivam em vosso coração, como a semente que germina em tenro lugar.

Poema em linha reta

Obra de Miró

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar dos olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedindo emprestado sem pagar,
Eu, que quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Quem confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Quem contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez só foi vil?

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos, nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores, sem titubear?
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.


(Álvaro de Campos)

Paciência


Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede um pouco mais de alma
A vida não pára
Enquanto o tempo acelera e pede pressa
Eu me recuso faço hora vou na valsa
A vida é tão rara
Enquanto todo mundo espera a cura do mal
E a loucura finge que isso tudo é normal
Eu finjo ter paciência
O mundo vai girando cada vez mais veloz
A gente espera do mundo e o mundo espera de nós
Um pouco mais de paciência
Será que é o tempo que lhe falta pra perceber?
Será que temos esse tempo pra perder?
E quem quer saber
A vida é tão rara
Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma
Mesmo quando o corpo pede um pouco mais de alma
Eu sei, a vida não pára
Será que é tempo que me falta pra perceber?
Será que temos esse tempo pra perder?
E quem quer saber
A vida é tão rara
Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede um pouco mais de alma
Eu sei, a vida não pára.

(Lenine/Dudu Falcão)

quarta-feira, março 15, 2006

Soltar


Soltar não é subtrair-me, mas perceber que eu não posso controlar os outros.

Soltar não é tentar mudar os outros, mas dar o máximo de mim.

Soltar não é corrigir, mas dar suporte.

Soltar não é negar, mas aceitar.

Soltar não é ajustar tudo de acordo com os meus desejos, mas aceitar cada dia como venha.

Soltar não é parar de cuidar.

Soltar é amedrontar-se menos e amar mais.


(Brahma Kumaris)

Só o vento

Obra de Claude Monet

O vento bate em minha face,
Ele mexe comigo, congela
Balança os meus cabelos,
Venta forte lá fora agora.
O vento me levanta a saia,
Todos se viram a me olhar
O vento não quer parar,
Sopra vento me gela a alma.
O meu corpo sente, se recente,
O vento não quer parar,
Cai um chuvisco agora,
Troveja forte lá fora,
Sinto falta do meu amor,
Que dor eu choro...
O vento a ventar, a dor
Que não quer calar.
O vento forte a ventar
A dor a aumentar,
Sinto tua falta agora
E este vento não quer parar.
(Iris Padovan)

Escuridão


Apagaram-se as luzes do salão.
Entretive-me procurando uma caixa de fósforos e uma vela,
no escuro absoluto.
Foi então que,
deparei - me com uma janela
de onde se avistava a lua e lá fiquei a admirá-la,
mesmo minguante, como estava.
Esqueci-me do que buscava,
isso já não importava.
Percebi que, a escuridão fica mais clara,
quando a enfrentamos cara a cara,
sem medo, sem susto, sem expectativas.

(Véra Lúcia de Campos Maggioni)
Todo conteúdo desta obra está protegido pela lei dos Direitos Autorais de 19 de Fevereiro de 1998.
Proibido reprodução parcial ou total da obra.
Direitos Autorais Reservados - Véra Lúcia de Campos Maggioni - Vera&Poesia

terça-feira, março 14, 2006

Desapego


"Imagine-se numa galeria de arte observando as pessoas olharem os quadros.
Dificilmente você verá alguém com a face colada na tela.
Desapego é simplesmente dar um passo para trás e observar.
Mas como isso não é ensinado por nossos pais e professores, passamos por apertos quando ficamos muito perto da tela da vida.
Mestres nunca se aproximam demais das situações, mas também nunca viram as costas para elas.
Mestres nunca consomem as emoções e humores dos outros, mas nunca negam sua validade."

(Mike George, The Path of the Slave-The Path of the Master, Retreat, Nº10, London)

sábado, março 11, 2006

Velas, lamparinas & dançarinos


Tomem muito cuidado no destino
De determinadas sinfonias
Se a música é de dor-de-cotovelo
A festa da dor nunca termina
Se as danças arrastam-pés
Forrós desejam as Letras na sina
Se os rocks são velhos no salão
Pernas se voltam para o passado
Conjugando as determinações nos baús
Se equilibrarão ou não nos compassos
Conforme as questões
No espaço dentro das arquitetações
Nos corações irão bater novos passos
Rumos se formam entre (a)braços
Há musicalidade nos traços dos acordes
Da mente e nas linhas dos destinos
Cerrando ou quebrando correntes
Entre caminhos que desafi(n)am...

(Rosangela Aliberti)

E então, que quereis?...


Fiz ranger as folhas de jornal
abrindo-lhes as pálpebras piscantes.
E logo
de cada fronteira distante
subiu um cheiro de pólvora
perseguindo-me até em casa.
Nestes últimos vinte anos
nada de novo há
no rugir das tempestades.

Não estamos alegres,
é certo,
mas também por que razão
haveríamos de ficar tristes?
O mar da história
é agitado.
As ameaças
e as guerras
havemos de atravessá-las,
rompê-las ao meio,
cortando-as
como uma quilha corta
as ondas.
(Maiakóvski)

O vaqueiro

Obra de Aldemir Martins

Eu venho desde menino
Desde muito pequenino
Cumprindo o belo destino
Que me deu Nosso Senhor

Não nasci pra ser guerreiro
Nem infeliz estrangeiro
Eu num me entrego ao dinheiro
Só ao olhar do meu amor

Carrego nesse meus ombros
O sinal do Redentor
E tenho nessa parada
Quanto mais feliz eu sou

Eu nasci pra ser vaqueiro
Sou mais feliz brasileiro
Eu num invejo dinheiro
Nem diproma de doutor

(Patativa do Assaré)

quinta-feira, março 09, 2006

Epitáfio


Aqui jaz o Sol
Que criou a aurora
E deu luz ao dia
E apascentou a tarde

O mágico pastor
De mãos luminosas
Que fecundou as rosas
E as despetalou

Aqui jaz o Sol
O andrógino meigo
E violento, que

Possuiu a forma
De todas as mulheres
E morreu no mar


(Vinícius de Moraes)

A experiência maior


Eu antes tinha querido ser os outros
para conhecer o que não era eu.
Entendi então que eu já tinha sido os outros

e isso era fácil.
Minha experiência maior seria

ser o outro dos outros:
E o outro dos outros era eu.


(Clarice Lispector)

Louvação



Vou fazer a louvação - louvação, louvação
Do que deve ser louvado - ser louvado, ser louvado
Meu povo, preste atenção - atenção, atenção
Repare se estou errado
Louvando o que bem merece
Deixo o que é ruim de lado

E louvo, pra começar
Da vida o que é bem maior
Louvo a esperança da gente
Na vida, pra ser melhor
Quem espera sempre alcança
Três vezes salve a esperança!

Louvo quem espera sabendo
Que pra melhor esperar
Procede bem quem não pára
De sempre mais trabalhar
Que só espera sentado
Quem se acha conformado

Vou fazendo a louvação - louvação, louvação
Do que deve ser louvado - ser louvado, ser louvado
Quem 'tiver me escutando - atenção, atenção
Que me escute com cuidado
Louvando o que bem merece
Deixo o que é ruim de lado

Louvo agora e louvo sempre
O que grande sempre é
Louvo a força do homem
E a beleza da mulher
Louvo a paz pra haver na terra
Louvo o amor que espanta a guerra

Louvo a amizade do amigo
Que comigo há de morrer
Louvo a vida merecida
De quem morre pra viver
Louvo a luta repetida
Da vida pra não morrer

Vou fazendo a louvação - louvação, louvação
Do que deve ser louvado - ser louvado, ser louvado
De todos peço atenção - atenção, atenção
Falo de peito lavado
Louvando o que bem merece
Deixo o que é ruim de lado

Louvo a casa onde se mora
De junto da companheira
Louvo o jardim que se planta
Pra ver crescer a roseira
Louvo a canção que se canta
Pra chamar a primavera

Louvo quem canta e não canta
Porque não sabe cantar
Mas que cantará na certa
Quando enfim se apresentar
O dia certo e preciso
De toda a gente cantar

E assim fiz a louvação - louvação, louvação
Do que vi pra ser louvado - ser louvado, ser louvado
Se me ouviram com atenção - atenção, atenção
Saberão se estive errado
Louvando o que bem merece
Deixando o ruim de lado

(Gilberto Gil/Torquato Neto)

domingo, fevereiro 26, 2006

Minha liberdade


"Adoro o sentimento de liberdade quando tiro meu manto pesado da crítica, do medo, da culpa, dos ressentimentos e da vergonha.
Posso então perdoar a mim mesma e aos outros.
Isso nos liberta a todos.
Tenho vontade de abrir mão das velhas disputas.
Recuso-me a viver no passado.
Perdôo a mim mesma por ter carregado esses velhos fardos por tanto tempo.
Perdôo-me por não saber como amar a mim e aos outros.
Somos todos responsáveis por nosso comportamento, e o que damos, a vida nos retornará.
Portanto, não tenho necessidade de punir ninguém.
Todos estamos sob as leis de nossas próprias consciências.
Continuo em meu próprio projeto de limpar as partes não perdoadas em minha mente, e permito que o amor penetre.
Então, estou curada e inteira."
(Extraído do livro "Cartas para Louise"Louise L. Hay)

Gênio!


..............................................................
Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.

Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.

E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?).
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.

(Alberto Caeiro)

A procura

Obra de Tarsila do Amaral

Andei pelos caminhos da Vida.
Caminhei pelas ruas do Destino
-procurando meu signo.
Bati na porta da Fortuna,
mandou dizer que não estava.
Bati na porta da Fama,
falou que não podia atender.
Procurei a casa da Felicidade,
a vizinha da frente me informou
que ela tinha se mudado
sem deixar novo endereço.
Procurei a morada da Fortaleza.
Ela me fez entrar: deu-me veste nova,
perfumou-me os cabelos,
fez-me beber de seu vinho.
Acertei o meu caminho.
(Cora Coralina)

Neruda


Se cada dia cai, dentro de cada noite,
há um poço
onde a claridade está presa.
Há que sentar-se na beira
do poço da sombra
e pescar luz caída
com paciência.
(Pablo Neruda)

terça-feira, fevereiro 21, 2006

Aos moços

Caipirinha, de Tarsila do Amaral


Eu sou aquela mulher a quem o tempo muito ensinou.
Ensinou a amar a vida.
Não desistir da luta.
Recomeçar na derrota.
Renunciar às palavras e pensamentos negativos.
Acreditar nos valores humanos.
Ser otimista.

Creio numa força imanente
que vai ligando a família humana
numa corrente luminosade fraternidade universal.
Creio na solidariedade humana.
Creio na superação dos erros
e angústias do presente.

Acredito nos moços.
Exalto sua confiança,
generosidade e idealismo.
Creio nos milagres da ciência
e na descoberta de uma profilaxia
futura dos erros e violências
do presente.

Aprendi que mais vale lutar
do que recolher dinheiro fácil.
Antes acreditar do que duvidar.

(Cora Coralina)

Oração


Pai-Mãe, respiração da Vida, Fonte do som, Ação sem palavras, Criador do Cosmos!
Faça sua Luz brilhar dentro de nós, entre nós e fora de nós para que possamos torná-la útil. Ajude-nos a seguir nosso caminho
Respirando apenas o sentimento que emana do Senhor.
Nosso EU, no mesmo passo, possa estar com o Seu, para que caminhemos como Reis e Rainhas com todas as outras criaturas.
Que o Seu e o nosso desejo, sejam um só, em toda a Luz, assim como em todas as formas, em toda existência individual, assim como em todas as comunidades.
Faça-nos sentir a alma da Terra dentro de nós, pois, assim, sentiremos a Sabedoria que existe em tudo.
Não permita que a superficialidade e a aparência das coisas do mundo nos iluda,
E nos liberte de tudo aquilo que impede nosso crescimento.
Não nos deixe ser tomados pelo esquecimento de que o Senhor é o Poder e a Glória do mundo, a Canção que se renova de tempos em tempos e que a tudo embeleza.
Possa o Seu amor ser o solo onde crescem nossas ações.

Que assim seja!!!

Velhas árvores


Olha estas velhas árvores, mais belas,
Do que as árvores mais moças, mais amigas,
Tanto mais belas quanto mais antigas,
Vencedoras da idade e das procelas . . .

O homem, a fera e o inseto à sombra delas
Vivem livres de fomes e fadigas;
E em seus galhos abrigam-se as cantigas
E alegria das aves tagarelas . . .

Não choremos jamais a mocidade!
Envelheçamos rindo! envelheçamos
Como as árvores fortes envelhecem,

Na glória da alegria e da bondade
Agasalhando os pássaros nos ramos,
Dando sombra e consolo aos que padecem!

(Olavo Bilac)

Quem me dera...

Obra de Van Gogh

Quem me dera que eu fosse o pó da estrada
E que os pés dos pobres me estivessem pisando...

Quem me dera que eu fosse os rios que correm
E que as lavadeiras estivessem à minha beira...

Quem me dera que eu fosse os choupos à margem do rio
E tivesse só o céu por cima e água por baixo...

Quem me dera que eu fosse o burro do moleiro
E que ele me batesse e me estimasse...

Antes isso que ser o que atravessa a vida
Olhando para trás de si e tendo pena...

(Alberto Caieiro)

terça-feira, fevereiro 14, 2006

A dança

Obra de Edgar Degas

Veja a dança da vivência!
Muitos vivem da experiência.
Outros tantos, só da existência.
Muitos vivem na esperança.
Outros tantos, só na andança.
Porém, belo é fazer da existência, uma experiência de andança
na esperança.

Ou será,
Belo é fazer da esperança da existência
uma andança de experiência?
Belo é fazer da existência uma experiência
de andança na esperança?
Belo é fazer da andança da esperança,
uma experiência de existência?
Bela uma experiência de andança na existência da esperança?

É sua a dança!

(Maggioni, Véra Lúcia de Campos In: Mentiras em Tons de Verdade
[ Versos e Prosa ]; ASES, Santa Rosa – RS - Brasil; 2001.)

Todo conteúdo desta obra está protegido pela lei dos Direitos Autorais de 19 de Fevereiro de 1998.
Proibido reprodução parcial ou total da obra.
Direitos Autorais Reservados - Véra Lúcia de Campos Maggioni - Vera&Poesia

segunda-feira, fevereiro 13, 2006

Antes de amar-te...


Antes de amar-te, amor, nada era meu
Vacilei pelas ruas e as coisas:
Nada contava nem tinha nome:
O mundo era do ar que esperava.
E conheci salões cinzentos,
Túneis habitados pela lua,
Hangares cruéis que se despediam,
Perguntas que insistiam na areia.
Tudo estava vazio, morto e mudo,
Caído, abandonado e decaído,
Tudo era inalienavelmente alheio,
Tudo era dos outros e de ninguém,
Até que tua beleza e tua pobreza
De dádivas encheram o outono.

(Pablo Neruda)

Saudade

"Il primi passi", de Vincent Van Gogh

Belos amores perdidos,
Muito fiz eu com perder-vos;
Deixar-vos, sim: esquecer-vos
Fora demais, não o fiz.

Tudo se arranca do seio,
- Amor, desejo, esperança...
Só não se arranca lembrança
De quando se foi feliz.

Roseira cheia de rosas,
Roseira cheia de espinhos,
Que eu deixei pelos caminhos,
Aberta em flor, e parti:

Por me não perder, perdi-te:
Mas mal posso assegurar-me,
- Com te perder e ganhar-me,
Se ganhei ou se perdi...

(Vicente de Carvalho)

Valor


"Um pedreiro não sabia valorizar a si mesmo. Vendo um rico mercador,ele quis ser como ele. Quando se tornou um rico mercador, ele se deu conta de que, com todo esse poder, ainda tinha que se curvar perante o rei; claro, agora ele queria ser rei. E assim aconteceu, até que ele notou como o Sol o incomodava com o seu calor. Como o Sol é poderoso, ele pensou, e então transformou-se no Sol, até que uma nuvem mostrou seu poder, cobrindo-o. Ele tornou-se então a poderosa nuvem, até que, um dia, o poderoso vento começou a empurrá-lo. Ele então se transformou no vento, que podia fazer tudo, exceto soprar a poderosa pedra. Ele se tornou a pedra, mais poderosa do qualquer coisa na face da Terra. E, enquanto ali estava orgulhoso ao Sol, ele se perguntou o que poderia ser mais poderoso do que a pedra. E, ao olhar para baixo, ele viu um pedreiro, cortando-o com um cinzel."
Extraído de: "O Tao da Boa Forma Interior" - Jerry Lich e Chungliang Al Huang

O mundo é grande



O mundo é grande e cabe
nesta janela sobre o mar.
O mar é grande e cabe
na cama e no colchão de amar.
O amor é grande e cabe
no breve espaço de beijar.
(Carlos Drummond de Andrade)

sexta-feira, fevereiro 10, 2006

A ti mesmo deves prometer


Ser tão forte que nada seja capaz de perturbar a paz da tua mente.
Falar a todos quanto encontrares, de felicidade, de saúde e de prosperidade.
Dar a todos os teus amigos a impressão de que possuem valor.
Pensar somente no melhor, trabalhar unicamente pelo melhor e contar unicamente com o melhor.
Ser tão justo e tão entusiasta a respeito do êxito dos outros quanto o és em relação ao teu próprio.
Esquecer os erros do passado e concentrar as tuas energias nas grandes conquistas do futuro.
Manter sempre um semblante alegre, oferecendo um sorriso para todos as criaturas que encontrares no teu caminho.
Aplicar tanto tempo no melhoramento de ti mesmo que não sobre um único momento para criticar os outros.
Ser demasiado grande para te afligires, demasiado nobre para te irritares, demasiado forte para que te invada o temor, demasiado feliz para sentires contrariedades.
Ter uma excelente opinião de ti mesmo e proclamar isso ao mundo - não com altissonantes palavras, senão com grandes obras.
Ter a firme convicção de que o mundo está ao teu lado enquanto te mantiveres fiel ao que de melhor de ti existe.
Antes de falar, pensa cuidadosamente se o que vais dizer é verdadeiro, bom e útil; e se carece destas três qualidades, abstém-te de o dizeres.

(Divulgado pelo O.E.O. de New York)

Nem a luz de astro nem a luz de flor somente


Nem a luz de astro nem a luz de flor somente: um misto...
De astro e flor. Que olhos tais e que tais lábios, certo,
(E só por serem seus) são muito mais do que isto...
Ela é a tulipa azul de meu sonho deserto.


Onde existe, não sei, mas quero crer que existo
No mesmo nicho astral que luares aberto,
Em que branca de luz sublime a tenho visto,
Longe daqui talvez, talvez do céu bem perto.


Ela vem, (sonoral!) vibrante como um sino,
Despertar-me no leito: ouro em tudo, - na face
De anjo morto, na voz, no olhar sobredivino.


Nasce a manhã, a luz não tem cheiro... Ei-la que assoma
Pelo ar sutil... Tem cheiro de luz, a manhã nasce...
Oh sonora audição colorida do aroma!

Alphonsus de Guimarães

quarta-feira, fevereiro 08, 2006

Canção mínima

Obra de Salvador Dali

"No mistério do Sem-Fim,
equilibra-se um planeta.
E, no planeta, um jardim,
e, no jardim, um canteiro;
no canteiro, uma violeta,
e, sobre ela, o dia inteiro,
entre o planeta e o Sem-Fim,
a asa de uma borboleta."

(Cecília Meireles)

segunda-feira, fevereiro 06, 2006

A vida



Na água do rio que procura o mar;
No mar sem fim; na luz que nos encanta;
Na montanha que aos ares se levanta;
No céu sem raias que deslumbra o olhar;

No astro maior, na mais humilde planta;
Na voz do vento, no clarão solar;
No inseto vil, no tronco secular,
A vida universal palpita e canta!

Vive até, no seu sono, a pedra bruta . . .
Tudo vive! E, alta noite, na mudez
De tudo, essa harmonia que se escuta

Correndo os ares, na amplidão perdida,
Essa música doce, é a voz, talvez,
Da alma de tudo, celebrando a Vida!

(Olavo Bilac)

Liberdade



Ai que prazer
Não cumprir um dever,
Ter um livro para ler
E não fazer !
Ler é maçada,
Estudar é nada.
Sol doira
Sem literatura
O rio corre, bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa,
De tão naturalmente matinal,
Como o tempo não tem pressa...
Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.

Quanto é melhor, quanto há bruma,
Esperar por D.Sebastião,
Quer venha ou não !

Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol, que peca
Só quando, em vez de criar, seca.

Mais que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças
Nem consta que tivesse biblioteca...

(Fernando Pessoa)

O burro

Mythical Beast, de Franz Marc

Vai ele a trote, pelo chão da serra,
Com a vista espantada e penetrante,
E ninguém nota em seu marchar volante,
A estupidez que este animal encerra.

Muitas vezes, manhoso, ele se emperra,
Sem dar uma passada para diante,
Outras vezes, pinota, revoltante,
E sacode o seu dono sobre a terra.

Mas contudo! Este bruto sem noção,
Que é capaz de fazer uma traição,
A quem quer que lhe venha na defesa,

É mais manso e tem mais inteligência
Do que o sábio que trata de ciência
E não crê no Senhor da Natureza.

(Patativa do Assaré)

Se eu pudesse...


Se eu pudesse trincar a terra toda
E sentir-lhe uma paladar,
Seria mais feliz um momento ...
Mas eu nem sempre quero ser feliz.
É preciso ser de vez em quando infeliz
Para se poder ser natural...
Nem tudo é dias de sol,
E a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso tomo a infelicidade com a felicidade
Naturalmente, como quem não estranha
Que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva ...
O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade,
Sentir como quem olha,
Pensar como quem anda,
E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,
E que o poente é belo e é bela a noite que fica...
Assim é e assim seja ...

(Alberto Caeiro)

O que tinha de ser

O beijo, de Klimt

Porque foste na vida
A última esperança
Encontrar-te me fez criança
Porque já eras meu
Sem eu saber sequer
Porque és meu homem
E eu tua mulher

Porque tu me chegaste
Sem me dizer que vinhas
E tuas mãos foram minhas com calma
Porque foste em minh'alma
Como um amanhecer
Porque foste o que tinha de ser.

(Vinícius de Moraes)

quinta-feira, fevereiro 02, 2006

Eu apenas queria que você soubesse...


Eu apenas queria que você soubesse
Que aquela alegria ainda está comigo
E que a minha ternura não ficou na estrada
Não ficou no tempo, presa na poeira

Eu apenas queria que você soubesse
Que esta menina hoje é uma mulher
E que esta mulher é uma menina
Que colheu seu fruto, flor do seu carinho

Eu apenas queria dizer a todo mundo que me gosta
Que hoje eu me gosto muito mais
Porque me entendo muito mais também
E que a atitude de recomeçar é todo dia toda hora
É se respeitar na sua força e fé
E se olhar bem fundo até o dedão do pé

Eu apenas queira que você soubesse
Que essa criança brinca nesta roda
E não teme o corte de novas feridas
pois tem a saúde que aprendeu com a vida


(Gonzaguinha)

Guerreiro da Luz

"Todo Guerreiro da Luz já ficou com medo de entrar em combate.
Todo Guerreiro da Luz já traiu e mentiu no passado.
Todo Guerreiro da Luz já perdeu a fé no futuro.
Todo Guerreiro da Luz já trilhou um caminho que não era o dele.
Todo Guerreiro da Luz já sofreu por coisas sem importância.
Todo Guerreiro da Luz já achou que não era Guerreiro da Luz.
Todo Guerreiro da Luz já falhou em suas obrigações espirituais.
Todo Guerreiro da Luz já disse sim quando queria dizer não.
Todo Guerreiro da Luz já feriu alguém que amava.

Por isso é um Guerreiro da Luz:
Passou por tudo isso, e não perdeu a esperança de ser melhor do que era."
(Paulo Coelho)

quarta-feira, fevereiro 01, 2006

Eros e Psique

Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,
E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.
(Fernando Pessoa)

domingo, janeiro 29, 2006

Amor


É urgente que, no relacionamento humano, se quebre a cortina do silêncio entre as criaturas e se fale a respeito dos sentimentos mútuos, sem vergonha e sem medo. A pessoa cuja presença é uma declaração de amor consegue criar um ambiente especial para si e para os que privam da sua convivência.
Quem diz ao outro: eu amo você, expressa a sua própria capacidade de amar, mas também, afirmando que o outro é amado, se faz amar e cria amor ao seu redor.
(Mahatma Gandhi)

Precisão

O nascimento de Venus, de Sandro Botticelli

O que me tranqüiliza é que tudo o que existe,
existe com uma precisão absoluta.
O que for do tamanho de uma cabeça de alfinete
não transborda nem uma fração de milímetro
além do tamanho de uma cabeça de alfinete.
Tudo o que existe é de uma grande exatidão.
Pena é que a maior parte do que existe
com essa exatidão
nos é tecnicamente invisível.
O bom é que a verdade chega a nós
como um sentido secreto das coisas.
Nós terminamos adivinhando, confusos,
a perfeição.


(Clarice Lispector)

sexta-feira, janeiro 27, 2006

Fernando Pessoa



Nem sempre sou igual no que digo e escrevo.
Mudo, mas não mudo muito.
A cor das flores não é a mesma ao sol
De, que quando uma nuvem passa
Ou quando entra a noite
E as flores são cor da sombra.
Mas quem olha bem vê que são as mesmas flores.
Por isso quando pareço não concordar comigo,
Reparem bem para mim:
Se estava virado para a direita,
Voltei-me agora para a esquerda,
Mas sou sempre eu, assente sobre os mesmos pés
–O mesmo sempre, graças ao céu e à terra
E aos meus olhos e ouvidos atentos
E à minha clara simplicidade de alma...

quarta-feira, janeiro 25, 2006

Página em construção


Deus deixou várias coisas para terminar, de modo que o homem possa exercer suas habilidades.
Deixou a eletricidade na nuvem e o óleo no fundo da terra.
Criou os rios sem pontes, as florestas sem estradas, os campos sem casas.
Deixou as pinturas do lado de fora dos quadros, os sentimentos para serem descritos, as montanhas para serem conquistadas, os problemas para serem resolvidos.
Deus deixou várias coisas para terminar, de modo que o homem possa compartilhar a alegria da criação.

(Paulo Coelho)

Tela de Miró

domingo, janeiro 22, 2006

Amor de índio

Tudo que move é sagrado
e remove as montanhas
com todo o cuidado, meu amor.
Enquanto a chama arder
todo dia te ver passar
tudo viver a teu lado
com arco da promessa
do azul pintado, pra durar.
Abelha fazendo o mel
vale o tempo que não voou
A estrela caiu do céu
O pedido que se pensou
O destino que se cumpriu
de sentir seu calor
e ser todo
Todo dia é de viver
para ser o que for
e ser tudo

Sim, todo amor é sagrado
e o fruto do trabalho é mais que sagrado, meu amor.
A massa que faz o pão
vale a luz do teu suor
Lembra que o sono é sagrado
e alimenta de horizontes
o tempo acordado, de viver.
No inverno te proteger, no verão sair pra pescar
no outono te conheçer, primavera poder gostar
no estio me derreter
pra na chuva dançar e andar junto
O destino que se cumpriu de sentir seu calor e ser tudo.


(Beto Guedes)

A um passarinho

Para que vieste
na minha janela
meter o nariz?
Se foi por um verso
não sou mais poeta
ando tão feliz!
Se é para uma prosa
não sou Anchieta
nem venho de Assis

Deixa-te de história
Some-te daqui!
(Vinícius de Moraes)

Como a floresta secular



Como a floresta secular, sombria,
Virgem do passo humano e do machado,
Onde apenas, horrendo, ecoa o brado
Do tigre, e cuja agreste ramaria

Não atravessa nunca a luz do dia,
Assim também, da luz do amor privado,
Tinhas o coração ermo e fechado,
Como a floresta secular, sombria...

Hoje, entre os ramos, a canção sonora
Soltam festivamente os passarinhos.
Tinge o cimo das árvores a aurora...

Palpitam flores, estremecem ninhos, . .
E o sol do amor, que não entrava outrora,
Entra dourando a areia dos caminhos.
(Olavo Bilac)